segunda-feira, 2 de abril de 2012

Back to Taizé... Dia 4: Será que um dia me vou esquecer do que sinto aqui?

Hoje o Hard Sun não me acordou.

Tive finalmente uma noite tranquila e sinto agora os efeitos disso.
São 12h e ainda não abri a boca uma única vez. Acordámos a tempo de ter 15 minutos para nos prepararmos para a oração da manhã.
A excitação da chegada já passou e agora sinto-me "one of them".
Não estive minimamente focada nesta oração. Pensamentos dispersos, não me lembro dos cânticos nem de quem se sentou ao meu lado. As palavras do irmão entraram e saíram sem deixar rasto. A minha irmã abraça-me e lembro-me dos anos em que falava disto e eu não dava importância.
Ui... estou em branco. Não tenho palavras para pôr no papel, nem emoções para descrever. Sinto calor, as saudades batem forte e eu tenho medo. Até tenho medo de pensar nas minhas questões.
Tenho medo de encontrar respostas. As Tuas respostas.

Grupo de partilha. "The Kingdom of God is like Facebook". Tu-ru-tu!
God is asking you to be His friend. Accept or Remind me Later?
You have accepted God's request.
You and God are now friends.
God likes it!
A nossa visão da parábola da Rede de Pesca. Seria tudo tão mais fácil.

De novo na alcatifa para a oração da noite. Nada de novo na nossa rotina.

Aspirar aquele pedaço da igreja, almoço (arroz com feijão+maçã+tigela de água) com o já mais coeso grupo de trabalho à sombra das árvores e hoje não há sesta, vamos até outra vila aqui perto, Cluny.

Momento da manhã: eu e a minha irmã a ensinar uma menina de 2 anos "Bonum est confidere, bonum est esperare Domine". Começou renitente, terminou com a pequena voz a sobressair entre todos à nossa volta.
Juntamo-nos ao grupo que já esperava pelo autocarro das 15h30, em direcção a Macon, com paragem em Cluny.
Encontramos uma típica vila francesa, pessoas simpáticas, distribuímos mais "bonjours" a quem passa, conhecemos a Sister Joan, com os maiores olhos azuis que já vi (talvez resultado das lentes fundo de garrafa), um sorriso puro e um "je suis content!" que nos enche a tarde.
Tenho medo de me repetir, mas a simplicidade e pureza destes momentos faz-me feliz.
Um croissant au chocolat, um café, duas túnicas para vestir e uma referência especial à Senhora que mas vendeu. Quando cá voltar, não me posso esquecer de a visitar na loja nova que vai abrir.
Chega de Cluny, é pequena, está vista, está sentida, está um bocadinho vivida.
Uma loja de música que cheirava bem.

Voltamos a Taizé a horas de jantar e surge o momento mais desagradável da viagem até agora. Jantar: prato de ervilhas. Uma fatia de pão com queijo, um tomate e uma maçã para te tratares.
O meu desagrado não passa despercebido aos estrangeiros que partilham o banco triangular connosco. "Hey!". Olho à volta. Vem lá do fundo, do 3º banco triangular. Uma rapariga chama-me e estende a mão com o seu tomate. "You want it?". Mais um sorriso de orelha a orelha. Fico sem reacção. No metro pode chegar uma mãe com 5 filhos, que não se levanta uma pessoa para dar o seu lugar, e esta, que nunca tinha visto na vida, lá ao fundo apercebe-se deste meu capricho e preocupa-se. Ela preocupa-se comigo. Sim, porque aqui não há o ser-simpático-por-ser-simpático e muito menos o ser-simpático-porque-ainda-me-podes-vir-a-ser-útil. Foi o momento 2 do dia.

Acabamos cedo o jantar. Corro para a alcatifa, falta quase uma hora, não importa, estou com uma vontade louca de escrever e o tempo não me vai chegar. Vontade louca de fotografar todos estes momentos. Fotografias que possam transmitir aos outros o que sinto, o que cheiro, os pormenores da terra nos pés do rapaz que se ajoelha à minha frente, da trança desalinhada da rapariga que se senta ao seu lado, os vincos dos panos laranja que se estendem do tecto até ao chão, sobre o fundo amarelo, o serpentear das chamas das velas que encaixam nos tijolos desorganizadamente organizados, o cheiro a incenso, a calma e a tranquilidade.
Posso escrever 200 páginas sobre esta viagem a Taizé, que nunca vou conseguir transmitir o que se vive aqui.
Esta gente toda à minha volta aguarda, com sorrisos cheios e olhares expectantes, mais uma oração que, vista de fora, é só mais uma oração. Com as mesmas paredes, os mesmos cânticos, o mesmo chão. Quem aqui vem sabe e percebe que não há uma oração igual a outra. Que uma mesma oração se pode converter em 4 mil vivências diferentes.
E hoje, eu quero a minha, e quero torná-la (ainda) mais especial.
Os irmãos entram, os sinos tocam. 20h30.

Já dentro do saco-cama, depois de uma oração confusa e, por isso, especial. Cantamos "Frieden, frieden hinter las se ich euch. Meinen frieden gabe ich euch. Euer herz verza ge nicht." - "My peace I leave, my peace I give you. Do not let your hearts be troubled."
Ela empurra-me para o corredor central.
Não quero, vejo tudo daqui, qual é a diferença?
"Crucem tuam adoramos Domine, ressurrecti onem tuam laudamos Domine. Laudamos et glorificamos. Ressurrecti onem tuam, laudamos Domine."
Agora é Ele que empurra e eu vou.
Daqui vejo tudo numa perspectiva diferente.
Não sabes nada sobre nada até o vivenciares. Pela 1ª vez, choro compulsivamente em Taizé.
Deixo (quase) tudo na cruz. Medos, preocupações, incapacidades e sentimentos menos bons aqui no chão, ao pé de Ti. Não consigo deixar tudo. O tempo está a passar tremendamente depressa. É presunção querer ver aqui uma luz no fundo do túnel? É demasiado audaz esperar por respostas neste sítio? Viajei 24h para chegar aqui, já experienciei a simplicidade desta comunidade, já sei que quero voltar. Estarei a sentir-me assim tão especial para querer mais?

"Se um homem tiver 100 ovelhas e uma delas se tresmalhar, não deixará as 99 no monte, para ir à procura da tresmalhada?". Então se sim, porque é que eu ainda para aqui ando, perdida?

Muita filosofia para mim a esta hora.

Sinto-me relaxada, mas ao mesmo tempo esgotada. São muitos momentos de reflexão, não estou habituada. É muita informação, são muitas imagens boas para tão poucos dias e acho que o meu coração não aguenta.

Saímos, estou apática, um crepe com chocolate e não me apetece estar no Oyak, quero dormir.

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