sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Taizé, 19 de Abril de 2011 - Amigos!

Continuo com vontade de escrever. Boa!
Tenho a mania de deixar textos inacabados, ideias incompletas, pensamentos por escrever.
Aqui não. Tenho vontade de pôr no papel sempre mais e mais. Talvez para levar um bocadinho disto àqueles de quem mais gosto. Tenho saudades. Aqui vou-me apercebendo de quem me lembro todos os dias, de quem me faz mais falta. Tu, tu, tu e tu. Lembro-me de vocês de hora a hora. Sim, vocês são aqueles com quem um dia quero partilhar este lugar.
Hoje escrevo dentro do saco-cama, à luz da lanterna do telemóvel. Tivemos um dia ainda mais preenchido porque conhecemos mais pessoas! Difícil recordar os nomes, mas acho que até ao fim da semana os vou levar comigo de volta para Lisboa.
Fomos muito corajosas! Onde é que eu me via a sair da cama às 07h00 para ir à missa? Aqui não foi sacrifício. Um irmão vietnamita ajoelha-se a meu lado e entoa os cânticos repetidamente. A voz faz eco em mim, no meu coração, e sinto-me abençoada por estar neste lugar, agora.
Aqui ninguém questiona de que religião és. Pouco importa se és católico, ortodoxo, protestante ou anglicano. Um sueco dizia-nos há pouco no Oyak que não sabia o que era Deus, que acreditava que existia algo mas sem conseguir contextualizar. Um agnóstico que veio aqui procurar e tentar sentir essa alguma coisa por descobrir. Lembrei-me de ti, e se gostarias de aqui estar. Lembro-me de ti demasiadas vezes e quero partilhar contigo demasiadas coisas.
Saímos da igreja e partimos para a oração (eu, a sair de uma missa para uma oração, yeah, right). Anseio pelos momentos em que fecho os olhos e canto, com 4 mil pessoas, uma só frase, repetidas e repetidas vezes. Às vezes não fazem sentido e tento, palavra a palavra, que essas frases me acendam uma luzinha na mente, no coração, e que de repente descubra o que faço aqui.
Outras vezes, procuro a tradução para uma letra numa língua que desconheço, e canto como se tivesse nascido na Lituânia, na Rússia ou na Suécia.
Ontem não falei na voz de anjo que se sentou a meu lado. Ontem quase não cantei, só para ouvir melhor.
Calças largas, camisola justa, pés descalços, sandálias alinhadas ao lado, olhos e pele claros, cabelos loiros compridos enrolados numa trança. Pergunto-me o porquê de estar aqui, há quanto tempo está aqui, como é a sua vida. Não importa. Ficou ao meu lado por alguma razão e escrevo sobre ela para mais tarde me recordar dela, por alguma razão.
Hoje, quando entrámos na igreja para esta oração, foi impossível não reparar numa fila de crianças sentadas.
Dois ingleses, uma chinesinha e uma francesa. Sento-me ao lado deles e, por uns momentos, tenho vontade de me misturar com eles, ser como eles. Apetece-me perguntar: "Can I have your life?", mas sai-me um "Can I take a picture with you?". Recebo um "yes" envergonhado. Olho para eles, sorrio, e digo "You've just made my day".
Quatro mãozinhas a abanar em forma de despedida e sigo. Hoje não estou concentrada. Hoje sei que estas orações não vão ter o efeito que quero em mim. Não sei onde me pára o pensamento. Se calhar é bom... Se calhar, estar perdida é meio caminho para me encontrar.
Mais uma hora de serviço comunitário, mais três nomes da nossa equipa de trabalho decorados, couscous com legumes, uma fatia de pão com camembert, uma tigela de água e uma maçã e caímos para o lado de cansaço. Uma hora de sono e um passeio à vila mais próxima, Amugny. Distribuímos "bonjours" aos nativos, apreciamos o som da paisagem, uma igreja a cair de velha do tempo dos vickings e casas de suster a respiração. Deve ser quase impossível não ser feliz aqui.
Voltamos para trás, uma paragem no muro de pedro, gargalhadas até Taizé.
São 18h00 e a fila para o jantar deve estar quase a formar-se. Sentar. Esperar 5 minutos até que alguém se junte a nós... ok, cá estão eles, 'bora lá conversar e ensinar e aprender a fazer música com as mãos.
Jantar. Hoje somos das primeiras para a fila NO MEAT. Massa com óregãos, pão com queijo, mousse de chocolate, uma laranja e... claro, um tigela de água. Os bancos corridos em forma de triângulo obrigam a conviver com estranhos. Temos a Pamela, sueca, o John (?), alemão, e a (?) espanhola. A conversa do costume, obrigada pela companhia, vamos beber café, a Pamela vem connosco.
Uma serpente de copos de mousse, com alguns metros, atravessa-se no nosso caminho. As pessoas olham, gritam "yey!" e seguem como se nada fosse. É normal passar uma serpente de copos de mousse em Taizé. É normal que alguém ande enquanto faz o pino em Taizé. É normal, em Taizé, que as pessoas simplesmente se expressem. Que gritem se lhes apetece gritar. Porque aqui, toda a gente acha normal que as pessoas sejam o que são.
Chegamos ao Oyak, café por favor, reconhecemos a Elisabet e a Rosa, conhecemos o Thierry, cantamos e logo se juntam mais tugas. O tuga é conhecido em Taizé como o mais festeiro e o menos pontual.
Oração da noite, mais um dia a acabar, já é 3ª feira, o tempo a escorrer-me por entre os dedos.
Benção do irmão Alois, toco-lhe na mão esquerda e sinto a pele enrugada, de quem já fez tanto por esta comunidade, principalmente desde há 5 anos para cá.
Café no Oyak. Parece a festa da aldeia, com uma amostra do mundo inteiros. "Can we join you?". A frase de Taizé. Três suecos simpáticos, é a sua primeira vez cá, já nos tínhamos visto, estamos na camarata em frente. Uma cerveja entornada na minha roupa, um sueco cavalheiro extremamente preocupado, partilha de ideias sobre religião, pseudo-aulas de sueco e português e a estranha sensação de que será que é normal ter de andar 2 mil e tal kms para conhecer pessoas novas?
A Suécia é o povo mais feliz do mundo, segundo um estudo de 2010. A ver pelo sorriso destes três, parece que é verdade.
Dizemos adeus, despedimo-nos de mais umas caras conhecidas que andam por ali (que bom!) e 'bora.
Banho, conversa, escrever, despertador, dormir.



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